Fantasias Brasileiras
Pérfida Iguana homenageia o histórico Ballet IV Centenário em Fantasias Brasileiras, encenado nas ruas de São Paulo
O espetáculo, que tem direção de Renan Marcondes, recria quatro coreografias que marcaram trajetória desse grupo fundamental para a história da dança na década de 1950
Com uma breve e emblemática trajetória, o Ballet IV Centenário revolucionou a cena da dança nos anos 50 ao inovar tanto em termos coreográficos como em propostas de encenação. E o grupo Pérfida Iguana presta sua homenagem a esse importante coletivo artístico que completaria 70 anos em 2024 em Fantasias Brasileiras, encenado em diferentes ruas de São Paulo, de 9 de agosto a 5 de setembro.
As apresentações acontecem nos dias 9, 13, 14, 15 e 16 de agosto, às 17h, e no dia 17, às 16h, na escadaria do Theatro Municipal; no dia 27, às 11h e às 13h, na praça Oscar Silva, na Vila Guilherme; no dia 29, às 14h e às 16h, no Largo da Penha; e no dia 5 de setembro, às 14h e às 16h, no Largo da Batata.
O trabalho foi idealizado e dirigido por Renan Marcondes e é uma tentativa de recriação de quatro coreografias – Fantasia Brasileira, Lenda do Amor Impossível, O Guarda-Chuva e A Cangaceira – criadas pelo Ballet Quarto Centenário em 1954, que são consideradas verdadeiros marcos para a dança brasileira e das quais há poucos registros preservados. Esses trabalhos contaram com a participação de artistas muito importantes para a cena nacional, como cenógrafos, figurinistas e diretoras de arte. Entre essas feras, estão Flávio de Carvalho, Di Cavalcante, Heitor dos Prazeres e Noemia Mourão.
O Ballet IV Centenário estreou, com muitas percalços, em 1954 e foi encerrado em 1955, mas criou um total de 16 obras ao longo dessa curta carreira, a maioria delas – exceto as quatro resgatadas pelo espetáculo atual – tiveram elementos trazidos prontos da Europa pelo coreógrafo Aurélio Millos.
O diretor Renan Marcondes conta que, durante o processo criativo, os artistas visitaram acervos sobre o grupo homenageado para tentar recriar esses trabalhos a partir de fotos, críticas e figurinos. “Não há gravação das coreografias em vídeo; todos os registros que tivemos acesso estão em acervos como o da Bienal de São Paulo e do Theatro Municipal, que preserva os figurinos originais. A partir desse material, tentamos pensar mais ou menos como eram as danças mas também pensar em como eles poderiam sair dos acervos e tomar as ruas”, revela.
“Outro ponto desafiador é o fato de que as coreografias eram muito próprias do seu tempo e, por isso, continham visões estereotipadas do Brasil, a partir do olhar de um coreógrafo europeu sobre lendas indígenas, questões raciais, o folclore e as festas populares. A nossa pesquisa também envolveu um esforço para transpor e comentar os próprios limites históricos dessas coreografias”, acrescenta Marcondes.
O espetáculo é dividido em dois programas apresentados em dias alternados, um com as performances Fantasia Brasileira e Lenda do Amor Impossível e outro com O Guarda-Chuva e A Cangaceira. E os bailarinos Carolina Callegaro, Everton Ferreira, Isis Andreatta e Raul Rachou, todos com diferentes idades e formações, foram responsáveis por criar um solo a partir dessas coreografias, brincando com a figura do solista, que é muito central nesse tipo de dança.
A ideia de exumar essas coreografias não é apenas mostrar as poucas imagens, gestos, histórias e problemas dessas danças, entre o clichê e a radicalidade, mas reorganizar isso tudo isso no corpo e no espaço, do jeito que for possível.
As performances são uma espécie de miniteatro de rua que podem ser apresentadas em qualquer lugar, com bailarinos operando o cenário, mexendo na trilha sonora ou lidando com os figurinos o tempo todo em cena.
“Isso é uma referência ao fato de que o Ballet IV Centenário terminou de forma abrupta. Os bailarinos contavam que eles foram quase expulsos do Theatro Municipal, e, só algum tempo depois, conseguiram entrar para pegar suas coisas. Então, o fato de estar todo mundo em cena, na rua, carregando suas bolsas e mochilas como uma espécie de teatro-portátil, tem a ver com esse fato”, explica o diretor.
A composição coreográfica bebe na fonte dos tableau vivants, composições teatrais estáticas que imitam pinturas e fotografias. Aqui, eles são desenvolvidos a partir dos poucos registros em fotos e desenhos das produções do balé, visando uma forma cênica que, ao mesmo tempo, chame atenção pela estranheza e escala e permita a apreensão rápida do público passante.
Uma homenagem à Ruth Rachou (1927-2022)
Um dos principais nomes que iniciou seu percurso no Ballet IV Centenário foi Ruth Rachou, uma das responsáveis por trazer a dança moderna a São Paulo e por formar diversos artistas hoje atuantes na cena.
“Ruth nos deixou em 2022, e, com sua partida, perdemos uma das últimas vozes que ainda poderiam nos contar sobre as formas, expressões e conteúdos das danças do grupo. Convidamos para essa criação Raul Rachou, seu filho, também bailarino e que tem nos acompanhado nas nossas últimas criações, como Zulmira Elizabeth e Azul-jardim”, comenta Marcondes.
“Raul diz se lembrar de estar, ainda bebê, em um palco onde havia um enorme bonde de papel, que, possivelmente, pertencia à estrutura cenográfica de O Guarda-chuva. Acreditando que a transmissão de gestos, memórias e eventos na dança se dá por diversos meios que não apenas os discursivos ou técnicos, chamamos Raul para performar junto de Carolina Callegaro, Everton Ferreira e Isis Andreatta essa peça, colocando também gerações distintas da dança de São Paulo em diálogo e fazendo desta criação uma homenagem à Ruth Rachou”, antecipa o diretor.
Ficha Técnica
Um projeto do Pérfida Iguana
Concepção, textos e direção: Renan Marcondes
Assistência de direção: Carolina Callegaro
Criação e performance: Carolina Callegaro, Everton Ferreira, Isis Andreatta, Raul Rachou
Direção de arte, direção técnica e bonequeiro: Matias Arce
Assistência de direção de arte: Mateus Levy e e Paulina Olguin
Adereços vestíveis: Kitty O. Reis e San Pestana
Máscaras para “A Cangaceira”: Uberê Guelé
Trilha sonora original: Peri Pane e Otavio Ortega (gravada no Estúdio 100 Grilos)
Locução em off: Andréia Lara e Santtiago Locutor
Fotografia: Mariana Chama e Tetembua Dandara
Vídeos: Bruta Flor Filmes
Interlocução: Artur Kon e Clarissa Sacchelli
Produção executiva: Tati Mayumi
Coordenação de Produção: Tetembua Dandara
Agradecimento especial: Ana Teixeira e Neyde Rossi
Projeto contemplado pela 35ª edição da Lei de Fomento à Dança para a cidade de São Paulo e pelo Edital de Chamamento Artístico Externo do Complexo Theatro Municipal de São Paulo
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Acervos consultados: Arquivo Multimeios (Centro Cultural São Paulo), Arquivo Histórico Wanda Svevo (Fundação Bienal de São Paulo), Centro de documentação e memória do Theatro Municipal de São Paulo, Central Técnica de Produções Artísticas Chico Giacchieri, acervo pessoal de Neyde Rossi e Ruth Rachou.
Livros e pesquisas acadêmicas consultados: Dança moderna 1992-2022 (org. Cássia Navas, 2023), Ruth Rachou. Biografia (org. Bernadete Figueiredo e Izaías Almada, 2008), Fantasia Brasileira: o Balé do IV Centenário (Catálogo da exposição no Sesc Belenzinho, 1998), Fantasias (Kátia Canton, 2004); A interdisciplinaridade na obra de Flávio de Carvalho: Um estudo da série “A cangaceira” do acervo do MAC USP (Iniciação científica de Maíra Vaz Valente, 2008) e Os figurinos de Flavio de Carvalho para Cangaceira (1954): da criação artística ao patrimônio cultural (tese de doutorado de Kárita Garcia Soares, 2020).
Fotografias em cena produzidas com inteligência artificial a partir de originais de Kazmer, Richard Sasso e F. Pamplona.
Para Ruth Rachou, que nasceu em 1927, dançou no Balé IV Centenário e hoje é um Ipê amarelo.
Sinopse
Uma comissão, formada por artistas de diferentes formações e gerações da dança, busca exumar na rua quatro danças do histórico Balé IV Centenário que tematizaram o Brasil e que tiveram artistas locais como responsáveis pela criação: “Fantasia Brasileira”, “Lenda do Amor Impossível”, “O Guarda-Chuva” e “A Cangaceira”.
Aqui, exumar essas danças não é apenas mostrar as poucas imagens, gestos, histórias e problemas dessas danças entre o clichê e a radicalidade, mas reorganizar isso tudo no corpo e no espaço, do jeito que for possível. A cada dia se apresenta um programa com duas danças que partem desses restos para formar pinturas vivas desses balés, criando quadros breves daquilo que se lembra – seja a beleza de cada dança ou a violência do desmanche da companhia.
Serviço
Fantasias Brasileiras, da Pérfida Iguana
Duração: 40 minutos
Classificação: livre
Ingressos: Grátis
Escadaria do Theatro Municipal de São Paulo
Endereço: Praça Ramos de Azevedo, s/n – República
Quando: 9, 13, 14,15 e 16 de agosto, às 17h, e dia 17, às 16h.
20 de agosto às 14h e às 16h, 22 de agosto às 11h e às 13h
Praça Oscar Silva
Endereço: Praça Oscar Silva, s/n, Vila Guilherme
Quando: 27 de agosto, às 11h e às 13h
Largo da Penha
Endereço: Largo da Penha, s/n, Penha
Quando: 29 de agosto, às 14h e às 16h
Largo da Batata
Endereço: Largo da Batata, s/n, Pinheiros
Quando: 30 de agosto, às 11h e às 13h
Novo Anhangabaú
Endereço: Praça Ramos de Azevedo, s/n – República
Quando: 5 de setembro, às 11h e às 13h